Quarta-feira, 16 de janeiro de 2019
Não é de hoje que o mercado e os usuários sinalizam: mobile first. Em suma, já foi o tempo em que podíamos nos dar ao luxo de criar sites e portais pensando nas grandes interfaces de desktops e notebooks.
O Google vaticinou: com o uso cada vez maior de smartphones, o caminho a tomar precisa ser o oposto; os produtos digitais devem ser pensados, desde seu nascedouro, para o meio móvel e suas interfaces menores e conteúdos objetivos. Espelho dos anseios dos usuários, cada parâmetro do Google é visto com muito respeito por marcas, produtos e serviços que não desejam perder nenhuma posição no ranqueamento dos buscadores.
Assim, o jogo virou: o que antes era produzido para um ambiente onde o consumo de conteúdo era mais lento e tranquilo, passou a ser planejado para atender à demanda por rapidez e praticidade no acesso às informações.
Mergulhei no universo da produção de conteúdo móvel há dois anos, atraído pela nova realidade que se apresentava, consequência direta do Webwriting pensado, já há duas décadas, e ao qual me dedico com tanto afinco – o que resultou também em três livros sobre o assunto.
Mas o UX Writing – criação de conteúdo para interfaces móveis – era algo praticamente novo, e precisei de tempo para entender, junto aos meus clientes, o que estava acontecendo. É todo um universo inédito, pronto para ser explorado, e muitas são as perguntas que me fazem desde que comecei a estudá-lo.
De que forma o conteúdo deve ser apresentado para um público que o consulta em movimento, cercado por estímulos visuais e auditivos que estimulam a dispersão? O conteúdo, em si, difere do que é produzido para as interfaces maiores? Quais seriam as diferenças?
Segue, aqui, então, uma lista com conclusões as que cheguei ao longo deste tempo, fruto de conversas, observações, consulta a pesquisas – e, sim, muita tentativa e erro.
Sim, você pode ler a versão móvel de um site noticioso em seu smartphone, mas sabemos que a grande vantagem do meio móvel é o uso dos aplicativos. O que mais desejamos no mobile não é ler, mas sim consultar informações. Nada mais prático que abrir um app e ter acesso a bancos de dados que nos entregam, em segundos, informações das quais precisamos – isso sem falar nos serviços. Afinal, o e-commerce mudou depois que passamos a poder comprar rapidamente via smartphone. Ou seja, esqueça a realidade da leitura das interfaces maiores; aqui, o que se quer é ter acesso às soluções, não importa se a necessidade é a consulta, a compra ou o entretenimento.
Esqueça os textos que estávamos acostumados a consumir nos desktops e notebooks, não há mais espaço para eles. Sim, eu me refiro – literalmente – ao espaço na tela. O bom design de interface móvel é aquele que privilegia a palavra como centro da comunicação escrita, e não o texto corrido. Como a interface é pequena, o que desejamos do conteúdo textual é orientação, e nesta tarefa a palavra toma à frente, apontando caminhos para atingirmos nossos objetivos. Aqui, a escrita existe como sinalização, não como conversa.
Há pelo menos uma década, com o amadurecimento da forma como consumimos informação, pedimos muito mais conteúdo online. Queremos informações objetivas, e não subjetividade. Neste processo, passamos a encarar as imagens de outra forma, e dela exigimos não apenas “paisagem”, mas elementos visuais que trabalham com a informação. E assim tem sido – mas não no ambiente móvel. Nas pequenas interfaces em que o esforço para consumir conteúdo é inversamente proporcional ao tamanho, a imagem não é capaz de comunicar da maneira que acontece em nossos computadores. Fotografia e ilustração são, neste cenário, elementos de relaxamento. Servem como um oásis em meio a uma interface que pede muito de nossos sentidos e, consequentemente, do nosso modelo mental.
Grande exceção no trabalho de se comunicar através de imagens, o infográfico é o elemento da informação que aponta para o futuro das interfaces móveis. Surgido da mídia impressa e popularizado na mídia digital – tendo feito o caminho inverso, inclusive, chegando a revitalizar algumas publicações em papel -, o infográfico resume, visualmente, informações que, em outras interfaces, comporiam um texto. Para um ambiente tão limitado, contudo, o infográfico possui um recurso de comunicação raro e poderoso: ele mescla palavra e imagem em um só elemento, economizando espaço e raciocínio. Nada supera o infográfico no meio móvel; entre ele e um texto, por menor e objetivo que seja, opte pelo infográfico.
Existem dois universos paralelos quando falamos de vídeo no meio online: o YouTube e os vídeos embedados em sites, portais, blogs e, agora, em apps. Não estamos, neste item, falando de YouTube, onde assiste-se filmes de horas de duração, o que vale para interfaces grandes ou pequenas. O ponto, aqui, são, justamente, os vídeos embedados, e como sua duração deve diferir de interfaces maiores para menores. Em desktops e notebooks, há tempos sabemos que a duração dos vídeos deve chegar a 1,5 minutos – no máximo. Para o meio móvel, contudo, a exigência dos usuários é muitíssimo maior: a recomendação é que vídeos não passem de 30 segundos. Contudo, eu iria além: conviva com a ideia de 15 segundos. Recursos como os do Instagram Stories têm acostumado os usuários a conteúdos de curtíssima duração, e é por este caminho que o vídeo avança.
Em minha missão quase diária de pesquisar o universo da informação para o meio móvel, costumo trabalhar com o modelo que chamo de “T” do conteúdo digital. Eu explico: os sites e os portais, como sua estrutura de camadas de informação verticais, não apenas possibilitam, mas estimulam a criação de conhecimento quando acessados via interfaces maiores como desktops e notebooks. Checamos páginas diversas de conteúdo nestes ambientes, e, de lá, saímos com um conhecimento formado de acordo com o nosso interesse. Nos aplicativos das interfaces móveis, isso não acontece. Acessamos apps com o intuito de consulta, seja para realizar transações ou consultar bancos de dados. O foco é a informação pura e simples, e não a construção de conhecimento. A estrutura é horizontal, sem necessidade de aprofundamento. Nenhuma das realidades é melhor ou pior; ambas podem e devem conviver. Afinal, os usuários utilizam as duas.
Ainda há muito que descobrir sobre conteúdo móvel. O que estamos vivenciando é apenas o início, e já ficou claro, para mim, que observar iniciativas de empresas e marcas neste cenário, em especial as brasileiras – a nossa realidade – é fundamental para construirmos parâmetros de qualidade em conteúdo móvel. Vamos em frente: trilhamos um bom caminho.
Consultor e professor, especialista em Informação para a Mídia Digital. Autor dos livros 'UX Writing: Principios y Estrategias' (Espanha, 2020), 'Em busca de boas práticas de UX Writing' (Brasil, 2019) e 'Webwriting: Pensando o texto para a mídia digital' (Brasil, 2000) - as primeiras obras em língua portuguesa e espanhola sobre Webwriting e UX Writing - e de 'Webwriting: Redação & informação para a web' (Brasil, 2006) e ‘Webwriting: Redação para a mídia digital’ (Brasil, 2014). Produziu para o Governo Federal o padrão brasileiro de redação online, 'Padrões Brasil e-Gov: Cartilha de Redação Web', documento que completou uma década em 2020. Em mais de vinte anos já prestou consultoria e ministrou treinamentos em Webwriting, UX Writing e Arquitetura da Informação para quase 90 empresas do Brasil e do exterior.
Comentários