Sexta-feira, 13 de maio de 2022
É animador e me enche de esperança observar o enorme espaço que a pauta ESG conquistou nos círculos empresariais, impulsionada por uma conjunção de forças que tem origem na urgente transformação do modo de se conduzir investimentos e negócios. Apesar de todo esse espaço, nossa visão como líderes empresariais ainda está em formação. O debate tem se concentrado nas motivações econômicas que nos levam a criar sistemas para lidar com aspectos ambientais, sociais e de governança.
Imprescindível, no entanto, olhar para o ESG também sob uma perspectiva humana, e enxergar o papel das organizações na construção de caminhos sustentáveis para o mundo. Para nos engajarmos com a profundidade necessária, é fundamental que a sigla ESG faça sentido não apenas para o sistema econômico, mas também para cada um de nós. Só nos engajamos ao que faz sentido, e não seremos capazes de salvar o mundo, de forma caricata, simplesmente “porque o Larry Fink mandou”.
O bilionário, que lidera a gestão de mais de US$ 10 trilhões em ativos, tornou-se mais conhecido por suas cartas anuais a CEOs, que assertivamente definem contornos para um capitalismo conduzido por relacionamentos mutuamente benéficos a todas as partes. As declarações de Fink deixam claro ao mercado o motivo econômico: “Nós nos concentramos em sustentabilidade não porque somos ambientalistas, mas porque somos capitalistas e fiduciários para nossos clientes”.
Assim como aos gestores de fundos, o dever fiduciário compele empresários, administradores e lideranças organizacionais a assumir que a lucratividade de uma empresa depende basicamente de sua contribuição para o mundo, expressa em um propósito claro, perseguido por relacionamentos mutuamente benéficos com seus colaboradores, clientes, fornecedores e comunidades.
Enxergo aí a beleza do capitalismo: um sistema que, quando praticado com consciência sistêmica, é capaz de orientar forças interconectadas a produzir os resultados desejados pela sociedade. Evidente que o sistema, que aperfeiçoamos desde a Revolução Industrial, gerou enorme prosperidade. Em vários aspectos é possível dizer que vivemos os sonhos dos nossos bisavós. Coletivamente, no entanto, também produzimos resultados que ninguém quer. A transformação acelerada, e a crescente complexidade do mundo em que vivemos, tornam urgente o aprimoramento desse olhar.
A percepção desta emergência, que já causava alteração no fluxo de capitais e a re-precificação de ativos, ficou mais clara com a pandemia. Neste momento de excepcional transformação, desafios gigantes encontram soluções à altura, impulsionadas pelo universo de possibilidades habilitado por tecnologias disruptivas.
Propósitos evolutivos dão sentido às empresas. Nos maiores problemas do mundo talvez residam as maiores oportunidades de negócios. E é na direção delas que o capital consciente nos leva.
No campo ambiental, por exemplo, a descarbonização global tem o potencial de criar a maior oportunidade de investimento de todos os tempos.
No social, nem é preciso sair de casa para identificar oportunidades fantásticas: a mais recente pesquisa global do Gallup (2021) revela o tamanho do desperdício de potencial humano nas organizações, apontando que apenas 20% dos colaboradores são engajados à organização a que servem.
É vital, para a longevidade de uma empresa, que a maneira de pensar seu negócio seja coerente com o estado do mundo atual, e com o ponto em que ela está inserida na jornada humana. Essa consciência pode abrir espaço para a realização do valor que reside no potencial inato dos negócios para causar impacto positivo.
O claro e convincente motivo econômico para abraçar o ESG é gerado a partir da consciência de que o benefício ao sistema, aos múltiplos stakeholders, precede o benefício “para mim” ou “para o meu”. Envolve a percepção de nossa interdependência, de conexões ambientais e sociais que precisam ser conservadas, transformadas e regeneradas.
O papel do ESG na construção de caminhos para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) precisa partir de uma intencionalidade mais profunda para fazer sentido. É fundamental transcender o motivo econômico, para engajar pessoas nos diversos grupos de stakeholders, com abertura para a atualização de paradigmas. Desenvolver um novo olhar para como o mundo onde a empresa opera é impactado pelo que ela faz, como ela faz e por que ela faz. A transformação que precisamos virá da essência de como enxergamos o mundo e as nossas relações.
ESG de verdade não corre em paralelo ao negócio, incorpora a consciência à prática do próprio negócio. Desenvolve-se com a clareza de que empresas não são somente máquinas de gerar lucros. Enxerga que recursos naturais são muito mais que insumos produtivos. Que pessoas não são engrenagens. Atribui à organização o papel social, que não se restrinja a não agredir, mas deixe uma contribuição efetiva à cura da nossa sociedade e do nosso planeta.
O Capitalismo Consciente propõe um modelo que provê a sustentação de um ESG verdadeiro: percebendo a empresa como um sistema vivo movido por uma causa maior que a pura geração de lucros, integrando e harmonizando os interesses de cada parte no negócio por meio de uma cultura consciente, forjada por líderes com coragem para promover essa transformação.
Operando a partir dessa consciência sistêmica mais ampla, a pauta ESG pode focar no desenvolvimento dos artefatos, práticas, processos e sistemas que asseguram a governança e alavancam a eficácia na geração dos resultados desejados.
As práticas ESG são um pilar para as organizações e a sociedade se reinventarem, mantendo-se prósperas e longevas. A construção deste caminho complexo é coletiva por natureza. No sentido etimológico, complexo é aquilo que é tecido em conjunto, e sustentabilidade, por natureza, pressupõe uma visão interconectada, interdependente.
Seja para preservar ou para gerar valor, pela consciência das necessidades humanas, ou mesmo pela motivação puramente econômica, pelo amor ou pela dor, o ESG verdadeiro será fundamental para as empresas se manterem relevantes.
Eu escolho contar a história que fazemos pelo amor, pela vida. O ESG que eu quero começa com a essência, manifestada de forma simples, pelo Juramento da Empresa que Cura*:
“Primeiro, não prejudique
Vou administrar minha empresa de modo a não prejudicar os outros ou a terra
Erradique o mal
Nunca permitirei ou pactuarei com abuso e exploração. Serei um herói diário que defende a justiça, a verdade, a beleza, a integridade e a simples bondade
O amor conquista tudo
Vou funcionar com amor. Medirei o sucesso pela realização, abundância e alegria que eu proporcionar aos outros.”
*SISODIA, Raj; GELB, Michael. Empresas que curam. Alta Books, 2020
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CEO e membro do Conselho de Administração da Rudolph Investimentos e Participações. Em mais de 30 anos de experiência no setor industrial, liderou unidades de negócios de grandes empresas no Brasil, EUA e Europa, até encontrar, há 10 anos, o universo das empresas familiares. Atualmente lidera a filial Santa Catarina do Instituto Capitalismo Consciente Brasil, inspirando e contribuindo para a ampliação da consciência das organizações.
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