Segunda-feira, 07 de novembro de 2022
As mulheres passam por diversos desafios tanto na vida pessoal, quanto profissional. No mercado de comunicação e marketing isso não é diferente. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o número de mulheres superou em 4,8 milhões o de homens no Brasil. A população estimada em 2021 é de 212,7 milhões de pessoas. Desse total, 108,7 milhões (51,1%) são mulheres. Mesmo sendo maioria ainda não desfrutam da justa representatividade do seu desempenho dentro das empresas, principalmente entre os cargos de liderança. Outro dado também importante é do relatório “Women in the Workplace 2021”, da consultoria McKinsey, que revela que quanto mais alto for o cargo, menor a presença feminina – enquanto há 62% de homens brancos na alta liderança (C-Suite), há apenas 20% de mulheres brancas. De homens de cor, há 13%, e o percentual de mulheres é ainda mais baixo, atingindo apenas 4%.
De acordo com Fernanda Ramos, especialista em comunicação e diretora de marketing na Alpargatas S.A em Los Angeles, um dos principais desafios que as mulheres passam é a subestimação de suas capacidades, por isso se torna fundamental que as empresas invistam em políticas internas em relação à equidade de gêneros. “Apesar de esse assunto estar ganhando cada vez mais atenção, infelizmente a cultura predominante ainda é marcada por uma série de situações que, nos mais diferentes níveis, colocam as mulheres em posição de desvantagem. Departamentos de marketing e times criativos, por serem vistos como um ambiente mais “descontraído”, muitas vezes são mais propensos a esse cruzar de limites que podem resultar em falta de respeito, e que não podem ser justificados. A falta de treinamento, de políticas rígidas e regras claras sobre o tema também abrem brechas para situações que prejudicam as mulheres. Existe desigualdade de tratamento, de salários, de critérios de desempenho, entre outros problemas por vezes até mais sutis como abertura para um ponto de vista, a receptividade a uma ideia, o espaço para conclusão de um raciocínio ou a aprovação de projetos. Por isso, é fundamental entender que essa situação não é normal e que devemos atuar a favor dos nossos direitos, com diálogo, conhecimento dos fatos e de forma estruturada”, alerta a especialista.
Abaixo, a especialista lista os 10 principais desafios que as mulheres enfrentam no mundo do marketing. Confira:
“A diferença entre o salário recebido por homens e mulheres é antigo tópico de discussão e luta, em várias áreas. Apesar disso, progride a passos lentos pois ainda é comum notar a mesma vaga com salários e benefícios completamente diferentes e menores para as mulheres, principalmente em posições criativas ou de liderança, mesmo que isso se revele na abertura que determinada empresa tem na negociação na hora da contratação”, revela Fernanda.
Para se ter uma ideia, são frequentes os casos em que o masculino recebe 20% a mais do que o feminino. Os números mostram a discrepância salarial entre homens e mulheres: em 2019, o rendimento médio mensal deles no Brasil foi 28,7% maior. Segundo o IBGE, enquanto os profissionais do sexo masculino receberam R$ 2.555 – acima da média nacional de R$ 2.308 -, as mulheres ganharam R$ 1.985.
“Mesmo que velado, é um comportamento que predomina nos arredores do mundo do marketing, marcado pela baixa representatividade feminina em altos cargos, principalmente no Brasil. O preconceito e a desvalorização das mulheres muitas vezes as mantém longe do crescimento nas empresas. Trabalhando em Los Angeles percebi como existe uma cultura bastante diferente no que diz respeito à relação entre colaboradores, sejam do gênero que forem, de forma a proteger ambos os lados. Por exemplo, é muito comum que reuniões onde estejam apenas duas pessoas sejam feitas a portas abertas ou em salas com paredes de vidro. Perguntas pessoais, sobre o estado civil, a idade, ou se a pessoa tem filhos por exemplo, são praticamente inexistentes e altamente desencorajadas. Além disso, é praticamente proibido subir o tom, usar linguagens mais agressivas ou expor erros e problemas de um determinado profissional na frente de seus pares e equipe. Essas atitudes que causam “estranhamento ou grande avanço”, devem ser consideradas comuns”, explica Fernanda.
Um estudo do Ipea identificou que o número de mulheres que trabalham cai de 60,2% (um ano antes da gravidez) para 45,4% nos primeiros seis meses de vida do bebê. “A profissional na casa dos 30 anos muito comumente tem que enfrentar perguntas relacionadas à maternidade. Quantidade de filhos ou planos de engravidar até mesmo são abordados em entrevistas de emprego, e mesmo que não abordados, muitas vezes ficam implícitos e se transformam em desvantagem na hora de ser escolhida para determinada vaga ou promoção interna. Os fatos não mentem, metade das profissionais que se tornam mães são demitidas até dois anos depois que acaba a licença-maternidade, segundo uma pesquisa da FGV. É uma questão cultural muito difícil de ser mudada no curto prazo pois está enraizada no subconsciente das pessoas, mesmo entre as mulheres. A boa notícia é que alguns países e empresas já vêm testando alternativas com sucesso, principalmente ao implementar igualdade de benefícios entre homens, mulheres e mesmo entre pessoas sem filhos”, revela Fernanda
“Não é só sobre equidade de salários, é preciso investir em estratégias e políticas que teriam um impacto mais holístico na equidade de gêneros nas organizações, de forma ampliada. Treinamento formal e espaço para o diálogo são fundamentais, pesquisas internas, especialistas externos, mudanças na cultura do local de trabalho, estratégias afirmativas de igualdade, novas práticas e políticas de recrutamento e também de avaliação de desempenho, intensificar a comunicação da organização em torno do compromisso com a equidade de gênero, desenvolver a carreira das mulheres, entre outras.”, comenta Fernanda.
“A desigualdade de gênero ainda cria outros obstáculos no ambiente de trabalho, causando conflitos e gerando impactos psicológicos negativos para as mulheres. Nesse cenário, é muito comum citarmos o assédio sexual como um dos principais problemas, mas existem outros tipos de assédios e desrespeitos muito cometidos contra mulheres. Para se ter uma ideia, uma pesquisa da Aberje aponta que 72% das mulheres ja’ sofreram algum tipo de assédio no trabalho. Em meio a essa realidade, sempre acredito que informação e conhecimento são nossos melhores aliados, como sociedade e como times diversos que precisam conviver, colaborar e evoluir. No ambiente corporativo, é preciso que mulheres e homens se unam com o mesmo objetivo, com amplo apoio da liderança, a fim de implementar canais cada vez mais seguros de comunicação, aconselhamento, denúncia e gestão de consequências”, orienta Fernanda.
Pesquisas da ISMA-BR (International Stress Management Association no Brasil) mostram que é grande o número de pessoas que negligenciam a vida pessoal ao se dedicar mais à profissional por medo de demissão ou de ficar para trás em promoções. “Apesar dessa pauta estar sendo discutida há décadas, ela nunca foi tão atual como agora. Na realidade pós-Covid, onde a delimitação de espaços entre casa-escritório segue ainda em processo de redesenho, as organizações estão ficando para trás e demorando para se adaptar às novas demandas e necessidades de suas equipes e de suas famílias. Muitos profissionais estão exercendo seu poder de decisão e tomando para si o protagonismo nessa discussão, equilibrando a balança de poder entre empregado e empregador. É um movimento que precisa acontecer tanto entre mulheres quanto entre homens, também baseado em dados que comprovam a melhora da produtividade, da entrega das equipes e também da saúde física e emocional do colaborador. Para funcionar, o propósito deve estar alinhado com o propósito da empresa”, esclarece Fernanda.
Uma pesquisa divulgada pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV-IBRE) apontou que, desde 2012, a taxa de desemprego das mulheres é superior à dos homens. De acordo com o levantamento, o índice de desempregadas era de 16,45% em 2021, o equivalente a mais de 7,5 milhões de mulheres. No total, o índice médio anual de desemprego na economia foi de 13,20% em 2021, de acordo com o levantamento. O estudo foi feito com base em análise de dados da PNAD de 2021, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). “Esse é mais um efeito da mesma causa. Para além de respeitar e legitimar as mulheres em qualquer posição que seja, é necessário compreender que existe um déficit histórico e que a aceleração da solução passa por pensar ativamente na geração de oportunidades, desenvolver estruturas e abrir vagas pensadas e direcionadas para a equidade de gênero”, complementa Fernanda.
Uma pesquisa da Universidade Dominicana da Califórnia mostra que 70% das pessoas que estão no mercado de trabalho já se sentiram insuficientes ou temeram por ser ‘’descobertas como incapazes’’ para merecerem o cargo que exercem. “Não se achar boa ou capaz o suficiente é um sentimento com que muitas mulheres costumam se identificar ao longo de suas vidas profissionais, na grande maioria das vezes de forma injustificada. No mundo do marketing e da comunicação não é diferente. A falta de representatividade na liderança e a alta competitividade por posições agravam o problema e faz com que duvidemos das nossas próprias capacidades, criando uma tendência à auto sabotagem. De novo, a solução passa por criar espaços de diálogo. Ambientes seguros para poder conversar sobre isso de forma aberta e sem julgamentos precisam existir e devem ser incentivados dentro das empresas. Existe um valor enorme da união, na sororidade e na reconstrução da auto estima, que passa pelo cuidado com a saúde mental e pela legitimidade de poder dizer não”, complementa Fernanda.
Segundo uma pesquisa do Fórum Brasileiro de Segurança, nos doze primeiros meses da pandemia de Covid, 37,9% das brasileiras sofreram algum tipo de assédio de cunho sexual; 5,4% delas afirmaram ter sido beijadas sem seu consentimento, o equivalente a 3,7 milhões de mulheres de 16 anos ou mais; e 7,9% relataram ter sido assediadas no transporte público, cerca de 5,5 milhões de mulheres. “No ambiente corporativo, falar sobre assédio sexual sempre assusta, mas existem muitos tipos de assédio de fundo sexual que nem sempre se manifestam de formas óbvias e visíveis, mas que igualmente geram um ambiente de insegurança, onde ser mulher é um risco. Nesse sentido, investir não só em canais de denúncia mas também na construção de equipes mais diversas também construirá ambientes mais seguros para todos”, aconselha Fernanda.
“Mesmo tendo as mulheres mais diplomas universitários que os homens, elas representavam apenas 37,5% dos cargos gerenciais em 2019, segundo levantamento do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Apesar disso e de tantos desafios, eu sou otimista. É exatamente através do conhecimento e do desempenho diferenciado que vamos seguir diminuindo a desigualdade entre gêneros. Mulheres, em sua coletividade, aportam um enorme valor a todos os setores econômicos, principalmente no mundo do marketing e comunicação, nossos diferenciais e nossa contribuição são reais e concretos. Mulheres não são iguais aos homens e obviamente nem todos os homens ou mulheres são iguais entre si, e isso é algo a ser celebrado. A verdadeira mudança ocorrerá à medida que cada vez mais pessoas, times e empresas conseguirem ver valor concreto na diversidade e se organizar de forma a se beneficiar das diferenças.” finaliza Fernanda.
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